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  • Foto do escritorObservatório das Desigualdades

Racismo no Brasil

Atualizado: 23 de abr. de 2023


O texto a seguir foi construído a partir da colaboração de Gevanilda Gomes dos Santos (professora universitária aposentada e membro da Soweto Organização Negra, entidade paulista filiada a coordenação nacional de entidades negras – CONEN). Para ver ou ouvir clique no vídeo acima!

Para compreender a problemática do racismo na sociedade brasileira é importante destacar dois aspectos. Primeiro, a historicidade do fenômeno social consiste a sua história como o racismo se desenvolveu no Brasil, como ele se manifesta ainda na educação, no trabalho, na saúde, na cultura, nos meios de comunicação, na sociedade como um todo, porque assim podemos observar suas peculiaridades no âmbito interpessoal, no âmbito social e no âmbito político.

A importância de estudar o segundo aspecto, que é o caráter ideológico da ciência, está colocado porque a ciência no brasil se comportou de forma a encobrir ou revelar e explicar tal fenômeno. Há três etapas principais: a etapa eugenista; a etapa do racismo cordial, ou seja, da democracia racial (farsa da democracia racial) e a etapa do racismo estrutural. Estes aspectos da historicidade e o papel da ciência são importantes para nos ajudar a revelar os interesses da elite nacional e para a contestação do fenômeno do racismo pela resistência negra.

A historicidade do fenômeno racismo é uma perspectiva importante porque aborda a história de longa duração. Foram quase cinco séculos de dominação de negros e negras a partir da escravidão. Até hoje, a historicidade começa por localizar a origem deste fenômeno social, evidencia os conceitos de raça e escravidão para localizar e explicar a origem do racismo moderno à luz da etapa pré-colonial do capitalismo, e também relaciona dados históricos antes isolados. Um exemplo é o abolicionismo, que se entrelaça com o estímulo à imigração europeia na proclamação da república. A história do pensamento liberal no Brasil, também implantados a serviço da elite, é chave para explicar fatores inibidores da resistência negra e popular.

A historicidade refuta a história oficial dos vencedores, uma conta final que só fecha a favor das elites. Mas a equação fica sem solução para os subalternizados, que são os excluídos das vantagens sociais. Nessa perspectiva histórica o racismo mostra sua cara, ora eugenista, ora cordial e ora estrutural; tudo junto e misturado, com destaque para uma ou outra forma, a depender da correlação de forças entre resistência negra e acomodação racial.

Temos na nossa história episódios que confrontaram quilombismo e abolição oficial da escravatura, ou, ainda, a frente negra brasileira contra o mito da democracia racial. Isso envolve ainda, outras dimensões, como a legislativa, a exemplo da lei Afonso Arinos e a lei Caó. Ainda, o aspecto cultural e religioso, a exemplo das questões envolvendo o catolicismo e religião de matrizes africanas. Ou, ainda, as questões gênero: a beleza da mulher negra versus a beleza da mulher branca, a chefia doméstica da família negra versus a fragilidade da mulher branca. A hipersexualização do homem negro versus o poder do homem branco; o patriarcalismo colonial versus feminismo negro; a sensualidade da mulher negra versus o patriarcalismo colonial, a homofobia reinante na sociedade brasileira, dentre outros aspectos e contradições.

Atualmente reconhecemos os nexos históricos entre raça, escravidão e racismo nas frases midiatizadas que traduzem a exploração econômica, a aculturação, alienação ou a contestação desses aspectos. Por exemplo: temos a frase “não há capitalismo sem racismo”, do Malcom X. Ou a de Conceição Evaristo: “eles combinaram de nos matar e nós combinamos de morrer”. Outra frase muito divulgada: “quando a mulher negra se movimento, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”, palavras da ativista Angela Davis, dos Estados Unidos. Estas são frases retiradas da nossa história protagonizada por negros e negras que precisam de aprofundamento histórico, ela incorporou uma historicidade crítica e decolonial capaz de desconstruir a pseudociência ou sua tímida ação no combate ao racismo. Essas frases são exemplos dessa historicidade que problematiza a superação da realidade e a chamada neutralidade científica.

A historicidade do racismo, desde os aspectos eugenistas passando pelo racismo cordial, até a popularização do racismo estrutural, são importantes para o reconhecimento do fenômeno social, revelam seu caráter ideológico em cada uma das etapas. Isso ajuda a sociedade a tipificar o racismo, a problematizar os agentes sociais da mudança ou de manutenção dessa realidade.

Como dito anteriormente, a palavra racismo, bem como seu estudo, é recente na sociedade brasileira e passou por diversos significados. No Brasil, surgiu há mais de 40 anos, com a luta contemporânea inaugurada com o lançamento do Movimento Negro Unificado (MNU), nas escadarias do Teatro Municipal, na cidade de São Paulo. Antes o fenômeno foi negado, disfarçado e tratado como preconceito de cor. Atualmente o Brasil está se reeducando no campo das relações raciais e aprendendo a reconhecer e analisar as relações raciais a partir do conceito do racismo estrutural, mas isso é uma outra história…


Quer saber mais? Leia:

Davis, Angela. Mulheres, raça e classe São Paulo, Boitempo, 2016.

GONZALEZ, Lélia. A Juventude Negra Brasileira. In: ____. Primavera para as rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira pessoa. São Paulo: Diáspora Africana, 2018b.

GONZALEZ, Lélia. A Questão Negra no Brasil. In: ____. Primavera para as rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira pessoa. São Paulo: Diáspora Africana, 2018d.

GONZALEZ, Lélia. Racismo e Sexismo na Cultura Brasileira. In: ____. Primavera para as rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira pessoa. São Paulo: Diáspora Africana, 2018g.

EVARISTO, Conceição. A gente combinamos de não morrer. In.: Olhos d’Água. Rio de Janeiro: Pallas, 2015.NASCIMENTO, Abdias, 1991, O Quilombismo: Carta, Falas, Reflexões, Memórias. Informe, Brasília, Gabinete do Senador Darcy Ribeiro, 21-26.

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