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Racismo

Atualizado: 23 de abr. de 2023


O texto a seguir foi construído a partir da colaboração de Gevanilda Gomes dos Santos (professora universitária aposentada e membro da Soweto Organização Negra, entidade paulista filiada a coordenação nacional de entidades negras – CONEN). Para ver ou ouvir clique no vídeo acima!

Para compreender o racismo, é importante iniciar analisando se as relações raciais de uma dada sociedade são igualitárias ou desiguais. Sabemos que cada grupo étnico dentro de uma dada sociedade tem características identitárias próprias e visão de mundo peculiar, o confronto e a hierarquização daquelas diferenças cria desigualdade social. Por sua vez, a desigualdade racial surge quando um grupo étnico se impõe sobre o outro com o uso da violência e da força bélica, no intuito de dominá-lo. A dominação social abre caminho para o racismo.

No Brasil, as relações raciais dizem respeito ao relacionamento dos grupos sociais originários e formadores da nação brasileira: o branco, o africano e o indigena e suas respectivas descendências e mestiçagem. Elas foram e ainda são extremamente desiguais. O relacionamento entre o branco e o indigena não é igualitário nem equânime, é um relacionamento conflituoso e racista.

O racismo ao longo da nossa história (e sem anacronismos) tem vários sentidos e significados. A definição mais abrangente podemos dizer que é uma prática social extremamente violenta, desumana, que hierarquiza as diferenças entre os grupos sociais étnicos, estigmatiza os indivíduos por seus fenótipos, avalia e julga-os com o interesse em desvalorizar, submeter, obter vantagem pessoal, econômica, social, político, simbólica, para um grupo em detrimento do outro.

As formas correlatas do racismo são: o preconceito e a descriminação racial. Qual a diferença entre um e outro termo? O que os une?

O preconceito é um julgamento antecipado, unilateral, equivocado, sem conhecimento de causa que desqualifica o outro. Usualmente, o preconceito está no imaginário social e se reproduz, por exemplo, na comunicação, na linguagem e na linguística. No Brasil há preconceito quando utilizamos palavras pejorativas aos valores e a cultura de matriz africana ou indígena. Há também preconceito nas relações de gênero, que são classificadas como machismo, porque estigmatiza, desvaloriza e desumaniza a mulher.

A discriminação racial, é uma forma correlata do racismo que se manifesta em grau mais elevado. É uma atitude, uma prática social, que impõe separatismo entre os grupos étnicos, por exemplo, quando priva o outro do direito de ir e vir, ou seja, da liberdade de locomoção.

Os dois termos tem um ponto comum, tanto o preconceito como a discriminação racial se alimentam na crença da superioridade de um grupo étnico e na inferioridade do outro. Via de regra, a história mundial se acostumou a valorizar a civilização e a expansão europeia e difundir mundo afora os valores do individualismo, do racionalismo, o egocentrismo, o entesouramento, o patriarcalismo e o beligerantismo das guerras. Os demais padrões civilizatórios não ocidentais suncubiram ante as guerras entre as civilizações.

A visão histórica mundial da África ser o berço da humanidade foi apagada e silenciada. Além do perigo da história única, pouco diversa e acrítica, todos corremos o risco de mergulhar no contexto de extrema violência racial ou de gênero, que provoca a morte de negros e mulheres, que são denominados de genocídio e feminicídio.

O racismo mundo afora se apresenta de forma explícita ou não, mas o que significa dizer isso? Significa dizer que o racismo não se manifesta da mesma maneira. E, felizmente, ele tem sido cada vez melhor qualificado e compreendido. Nos Estados Unidos e na África do Sul, por exemplo, na época do sistema de apartheid, as sociedades incorporaram um modelo explicíto e segregacionista. O preconceito, a discriminação e o racismo se apresentam na forma institucionalizada, ordernados por legislação, e adentra os governos e os aparelhos do Estado, a força militar ou policial garante o separatismo. No Brasil o racismo não é explícito, sua natureza é camuflada e disfarçada, é um fenômeno negado, tipificado como cordial.

Mundo afora o racismo é tipificado como estrutural, institucional ou sistêmico. Racismo estrutural significa estar enraizado e com capilaridade por toda a sociedade, abrangendo as atividades culturais, perpassando as classe sociais, a comunicação, as instituições educacionais, de saúde e as instituições políticas. Quando é identificado nas instituições privadas ou públicas, incluindo seus profissionais, é denominado racismo institucional. O racismo incrustado mundialmente no sistema capitalista se denomina racismo sistêmico.

Portanto, o racismo se manifesta mundialmente e, em cada nação, adquire configuração social particular. Trata-se de um mecanismo típico da desigualdade social, da exploração econômica, da opressão social que subalterniza a população, os grupos e os indivíduos. No Brasil, geralmente quem está submetido a esta situação são os descendentes de africanos e os povos indígenas, todos não brancos. O conceito é complexo e sua compreensão requer abordagem multidisciplinar, juntando a filosofia, história, geografia, psicologia, política, dentre outras, e para compreendê-lo é necessário problematizar o seu papel na sociedade. Compreender como se manifesta nas classes sociais, com a sua evolução histórica: quais as vantagens e desvantagens da sua prática, quem garante e se beneficia com sua existência, quem atua na sua construção e quem são os protagonistas do combate ao racismo.


Quer saber mais? Leia:

Davis, Angela. Mulheres, raça e classe São Paulo, Boitempo, 2016.

GONZALEZ, Lélia. A Juventude Negra Brasileira. In: ____. Primavera para as rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira pessoa. São Paulo: Diáspora Africana, 2018b.

GONZALEZ, Lélia. A Questão Negra no Brasil. In: ____. Primavera para as rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira pessoa. São Paulo: Diáspora Africana, 2018d.

GONZALEZ, Lélia. Racismo e Sexismo na Cultura Brasileira. In: ____. Primavera para as rosas negras: Lélia Gonzalez em primeira pessoa. São Paulo: Diáspora Africana, 2018g.

EVARISTO, Conceição. A gente combinamos de não morrer. In.: Olhos d’Água. Rio de Janeiro: Pallas, 2015.NASCIMENTO, Abdias, 1991, O Quilombismo: Carta, Falas, Reflexões, Memórias. Informe, Brasília, Gabinete do Senador Darcy Ribeiro, 21-26.

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